sexta-feira, 15 de março de 2013

A menina e o passarinho (sobre a liberdade de se deixar partir)

Ao passar por entre as folhas secas, contemplando o tempo novo que se aproximara, ouviu um ruído, como se algo caísse dos galhos e se precipitasse por terra. Seus olhos miraram ali, aquela pequena vida, em penugem que caíra do ninho. Passarinho...
Tomo-o com cuidado entre as duas mãos, as mesmas que nesse ato deixou de envolver o próprio coração, deixaram de proteger-se de seus medos e naquela frágil criatura depositou-se. Saindo de si, deu-se, como o próprio ninho que de plantas viçosas, outrora ressequidas e mortas, no amanhã o serviam de abrigo. Ninho...

E o tempo, conhecedor das potências e fraquezas fez seu papel. Penugem agora espessa, asas mais fortalecidas e um coração que já alçara voo, olhos adiante, desejos de ir além... As mãos quentes da menina já não lhe pareciam o suficiente, nem tão pouco as propostas de estadia, mesmo seu grato querer, por dar-lhe proteção, saciavam diante da proposta de sonhar na carne, nas asas, o pretendido tocar do céu. Partir...

A menina já parecia compreender que grande parte não caberia a si, por maior empenho, por mais que o quisesse ali, sob seu cuidado, o passarinho fora criado para outras instâncias, outras distâncias e um dia teria de partir. Em uma de suas tentativas de alimentá-lo fora ferida por suas garras afiadas e entristeceu-se. Sentiu a incontida inclinação de cobrar o amor depositado, de exigir reconhecimento pelo confiado, esquecendo-se de todo aprendizado que aqueles tempos de doação incondicional haviam oferecido. Dar-se...

Pensou ela em soltá-lo naquele momento, lançá-lo sem titubear, abandoná-lo ao seu querer, ali, no mesmo lugar do encontro, para que já forte ou não ele seguisse seu rumo, já que era isso que seu coração pequeno somente em medida ansiava. Mas ele ainda precisava dela, seria prematura essa ruptura. Desejo e ação, ainda não eram passos concomitantes e ele, ao seu modo, a amara. Seria livre, sendo o que para sempre ele fora chamado a ser, nos ares de sua missão, seria essa a maneira mais bela que ele encontraria de demonstrar seu amor. Gratidão...

E foi assim, que no tempo favorável seu amigo alçou saudade. Não doera tanto, pois existira um sopro confortante que vinha do centro do jardim: Essa é minha vontade... – e acalmara não mortificando o bem querer, mas dando aos impulsos de posse, sentido de missão cumprida de gratuidade. Oferta.

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